As gentes bonitas estavam à solta na Ericeira no passado fim-de-semana.
Corpos esculturais, bronzeados imaculados, cabelos lisos e angelicamente loiros: eis os ingredientes de qualquer campeonato de surf que se preze.
Com algum pesar, constato que a fisionomia da (inocentemente) chamada típica mulher portuguesa, sofreu alterações significativas.
O ideal da mulher pequenina e maneirinha como a sardinha, foi substituído por pernas altas e bem escanzeladas, tez morena , cabelos loiros ou castanhos claros e uns honrosos 1,75m de altura!
Qual o futuro de nós, tacos simpáticos, práticos e compactos, neste mundo de musas esculturais de corpos atléticos?
Já para não falar dos vergonhosos 24 anos que já carrego nos ombros.
A crise da idade apodera-se de mim no momento de entrada no recinto do Festival.
Custa aceitar a ideia de que mais de metade dos presentes, tem no mínimo menos 4 anos do que eu.
E, a julgar pelas poses confiantes, quase que asseguro que sabem mais da vida do que eu.
Perplexa, limito-me a responder de braços cruzados, com um olhar reprovador: “Sinistro...isto é sinistro! Não passam de uns miúdos!”.
Encontro-me nessa altura num cenário digno de Morangos com Açúcar ( com os Cool Hipnoise a tocarem a música do Brother Joe e tudo!).
Como ser envelhecido que ameaço ser, dou por mim a questionar- com algum desdém confesso - as gerações futuras.
Vem-me automaticamente à ideia o sucesso das novelas da TVI, onde as barreiras da idade cedem perante corpos precocemente desenvolvidos e maquilhados, aparentemente capazes de sentir e viver as mesmas emoções que um corpo de 30 anos suporta.
Verdade se diga, muita gente com quem me cruzo e se aproxima do trigésimo aniversário, por vezes aparenta dispor de uma estrutura emocional muito mais debilitada, do que possuída por estes heróis novelescos que aguentam amores e desamores com uma leviandade transcendental, que lutam desmesurada e desenfreadamente – já para não dizer de uma forma exagerada e de extrema má educação – contra pais, professores e outros entes castradores, que tentam, em vão, fazer com que os meninos não levem a sua avante.
Pergunto-me: será este o tipo de jovens com quem teremos que lidar no futuro? Insubordinados, demasiado desenvolvidos, espantosamente impetuosos e caprichosos?
( Pequeno momento de pausa, para deixar claro que sim, eu quando posso vejo os Morangos e sabe-me lindamente! Facto esse que não implica uma ausência de sentido crítico!)
Já para não falar da lavagem cerebral que este tipo de programação televisiva opera, não apenas nos mais jovens como nos adultos sedentários que ela se dedicam no final do dia laboral.
Geram-se hábitos de comodismo e facilitismo, disponibilizando-se , 24h por dia , programas de conteúdo nulo que implicam o mínimo esforço mental para o espectador.
Este, sem se dar conta, habitua-se progressivamente a não pensar, a não reflectir sobre assuntos sérios, a não reclamar pela ausência de reportagens de fundo ou debates políticos, a não questionar o estado da nação, a alimentar-se de sensacionalismos altamente vendáveis!
Impressionante esta minha capacidade de abstracção.
Ainda que presente num campeonato de surf que teve um português como vencedor ( parabéns Saca whoever you are! ), ainda que num ambiente cool e apelativo ao relax mental e físico, ainda que rodeada de neurónios meio adormecidos, dou por mim a divagar com este tipo de pensamentos.Não há dúvida : eu sou um bicho estranho!