segunda-feira, agosto 07, 2006

Redescobertas



Ao fazer as malas, hesitei em levar comigo uma camisola de malha ou o simples casaco de algodão.

Notícias chegavam de Berlim de que a cidade estava mergulhada numa vaga de calor que enfraquecia os mais idosos, desesperava os utilizadores de transportes públicos e expulsava para as ruas cosmopolitas transeuntes que com as suas gargalhadas e cervejas alegravam as esplanadas.

Optei pela camisola de algodão, mas à cautela levei uns sapatos fechados em alternativa às chinelas da praxe.

Ao trancar o fecho da mala apercebi-me que pela primeira vez na minha vida, não dispunha de um mês inteiro de férias.

Simultaneamente, este foi também o primeiro ano em que a praia e o sol ficaram relegados para segundo lugar, o que de certa forma assustava, pelo inédito da coisa e pela suspeita de que uma incursão pela Alemanha pudesse vir a revelar-se demasiado cansativa ( o que a longo prazo se revelaria, de forma negativa, no meu desempenho profissional).

Escolher a Alemanha como um destino de férias gerou perplexidade em algumas pessoas com quem comentei a decisão repentina de viajar.

Apesar de afortunados pela abundância solar, português que se preze não troca o seu descanso de veraneio por umas férias agitadas num país onde a temperatura média de verão são 20º e onde a chuva resolve chegar sem ser convidada.

Abandonámos Lisboa incertos do que se nos reservava: a expectativa da redescoberta de Berlim e Heidelberg depois de oito anos poderia revelar-se decepcionante? Que dizer do meu companheiro de viagem que, pela primeira vez, iria finalmente conhecer as cidades de onde guardei tantas boas recordações que tão assiduamente lhe relatei?

Como mais tarde escrevi a uma amiga, redescobrir cidades obriga-nos à introspecção e à nostalgia, que por sua vez nos permitem ganhar uma objectividade desconhecida face à pessoa que outrora fomos quando naqueles lugares andámos.

As diferentes circunstâncias de tempo e a evolução pessoal estremecem as memórias e, atónitos, por vezes não nos reconhecemos nas anteriores fotografias, nas situações passadas, naquela pessoa que um dia passeou naquelas mesmas ruas e que hoje mal reconhecemos.

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