Numa leve investida ao balcão de revistas do “El Corte”, folheei a revistas de todos os géneros: novelescas, cinematográficas, de viagens, de culinária, de moda... enfim, toda a panóplia do costume com a qual mergulho em tempos de ócio.
Hoje, porém, os olhos caíram-me para a revista de letra côr-de-laranja que procura dar-nos respostas para as questões existenciais do dia à dia.
Falo, pois, da revista Psicologia, famosa pelas dicas "eu-sei-a-solução-para-todos-os-teus-problemas” e pelas suas capas povoadas por jovens actores em ascensão.
O que me chamou a atenção não foi a sorridente Madalena Brandão e a sua pose descontraída ( que, diga-se, faz indiciar tudo menos uma eventual necessidade de se sentar no divã da terapia), mas sim um destaque azul escuro no canto inferior esquerdo: “O porquê da Blogosfera?”
Ávida de curiosidade e divertida com a antevisão de uma análise séria e aborrecida dos “doutores da mente”, escancarei, sem pudor, a revista na página 46.
Porém, sempre se dirá que a leitura grátis no Corte Inglés não é, propriamente, olhada com bons olhos, pelo que a minha leitura foi superficial e apressada e, consequentemente, este post de azedume corre o risco de ser injusto.
Ora bem, descobri que Portugal é o segundo país no ranking dos países com o número mais elevado de blogs per capita, que todos os dias centenas (quiçá milhares) de portugueses publicam os seus mais íntimos pensamentos em frases ora bem estruturadas, ora medíocres ora demasiado apressadas que à partida não deveriam despertar tanta curiosidade.
Tal não causa perplexidade, independemente dos juízos de valor subentendidos.
Todavia, eis que sou confrontada com um dos principais parágrafos do antigo, o qual termina com a equiparação dos blogs às portas de casa-de-banho nos tão queridos anos 90, enquanto meios de desabafo e de partilha de pensamentos íntimos, concluindo o autor da peça que estas foram por aqueles superadas no sec. XXI.
Assaltada por imagens elucidativas de verdadeiros momentos de aflição, recordei os números de telefone da “Cátia” que “loves” o “Nelson” e da Sandra que, à distância de um telefonema, “faz tudo e sem vergonha”
Enquanto bloguista orgulhosa, custa-me a aceitar a equiparação da blogosfera às mensagens hieroglíficas e de teor pornográfico às quais fomos acostumados nesses locais de charme que são os WC´s públicos (Which reminds me, de uma questão existencial que me atormentou durante a adolescência: quem é que passa tempo suficiente numa casa-de-banho pública, dispõe de um marcador e consegue inspirar-se ao ponto de escrever sequer o seu nome?).
Salvo o devido respeito, não posso concordar com tal singelo pensamento conclusivo e, de certa forma, ofensivo.
Em primeiro lugar, porque a blogosfera não eliminou, de vez, as mensagens escrevinhadas nas portas das casa-de-banho.
Elas continuam presentes e a multiplicarem-se por esse país fora. ( Ou talvez tal se deva unicamente à ignorância do poder de difusão da internet por parte dos seus autores!)
Acresce que poucos serão os bloguistas que não se ofenderão face a uma afirmação daquele teor.
Afinal, segundo a análise psicológica constante na já referida revista, os blogues não passam de meios de catarse para os seus autores e devem ser lidos, de preferência, na casa de banho, tal como se de uma mensagem marcada com uma navalha se tratasse.
Ironias à parte, o que nos distancia (ou aproxima) dos psicólogos é esta mania danada de catalogar, analisar e questionar tudo.
Escrevo porque sim, tenho um blog porque me entretém, leio os dos outros porque gosto.
Egocêntrica? Problemática? Necessitada de terapia? Talvez. Nos dias que correm, quem não reúne todos estes requisitos? Deveria ir grafittar a minha mensagem numa parede? Ou escrevinhar a minha percepção da cultura em Portugal numa porta de casa-de-banho do Colombo?
É que, no final, quem lê aquele trecho do artigo, é levado a concluir que eu, juntamente com os outros milhares de “homemade publishers”, só temos blogs porque as portas das retretes públicas não dispõem de espaço suficiente para tanta produção intelectual!