Conto de Natal
Não consigo precisar as circunstâncias de tempo e modo em que se conheceram, mas isso pouco releva para o caso.
Estávamos em 1950, algures entre a Av. de Roma e o Bairro de Campo de Ourique e os nossos personagens principais davam, timidamente, os primeiros passos da relação que se viria a manter, de pedra e cal, até aos dias de hoje.
A. , menina burguesa e virtuosa, crescera sob a vigilância apertada da Titi que jamais suspeitara que F., jovem mancebo destacado algures no Norte para cumprimento do serviço militar forçado, não pretendendo abandonar a jovem A. ,mas sem meios para prover o seu sustento, decidira propor-lhe casamento, em absoluto segredo e à revelia das mais elementares regras de etiqueta.
Surpreendendo-se a si própria e jurando jamais arrepender-se da sua decisão, A. aceitou o pedido e essa promessa manteve, apesar de todas as ironias e desgostos com que a vida a presenteou, até aos dias que correm, sem queixumes ou ressentimentos.
Viveram dois anos em completo secretismo, à custa de cartas e de visitas relâmpago protegidos pelas artimanhas e mentiras que só uma mente apaixonada consegue imaginar.
A revelação às famílias, após a tropa e finalmente o primeiro emprego de F. , caiu como uma bomba estrondosa, cujos estragos ficam aquém do aparato.
Cinquenta e seis anos passaram.
Nem sempre fáceis, diria mesmo cheios de provações e sofrimento e, simultaneamente, como qualquer história de vida, cheios de aventuras e momentos alegres, de partilha e companheirismo.
Hoje, ainda continuam de mãos dadas, de espírito aberto, com sorrisos ternos.
Contam-nos a sua história, no final da consoada, qual presente antecipado para uma audiência interessada e comovida que, ao ouvir o testemunho, se apercebe de que ainda tem muito para aprender.
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