quarta-feira, novembro 10, 2004

Boa Hora


Estavam todos sentados na primeira fila, observando ansiosamente os gestos mecânicos da juíza.
Para ela tratava-se de mais um dia...mais um igual a tantos outros.
Para eles , naquele dia, àquela hora, naquela sala, ditavam-se os seus futuros.
A juíza não se deixa comover... Esta cena repete-se inúmeras vezes ao longo do ano. Ás vezes até mais do que uma vez por dia.
Ela não via rostos, percursos de vida, historiais ou sequer os familiares e amigos que se amontoavam nos últimos bancos da sala.
No entanto são estes últimos que constituem a visão perturbadora.
Através da respiração ofegante e descontrolada denunciavam o nervosismo crescente.
Muitos tinham os dedos cruzados em gestos de oração.
Muitos comentavam com desdém e rancor aos comentários proferidos pelo advogados enquanto interrogavam os arguidos.
Mas todos eles sofriam, ainda que uns mais em silêncio que outros.
Não são dossiers...não são números, siglas, pessoas colectivas nem meras parcelas de uma estatística.
São pessoas como nós, como eu e como tu, numa situação onde qualquer um de nós pode um dia vir a estar.
No último banco estão pessoas fragilizadas, assustadas e em choque.
E para estes , naquele momento, o menos importante é saber se os do primeiro banco são inocentes ou não...

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