Liberdade Inquestionada
Para a minha geração, o 25 de Abril tornou-se uma paródia, um feriado que serve como desculpa para excessos alcoólicos e fogo de artifício junto ao Tejo.
Associado a Zeca Afonso, Zé Mário Branco e Paulo de Carvalho, representa para a geração dos oitentas mais do que um ponto de viragem no passado recente da nação, um dia de cantilenas e repetições televisivas do cerca ao Quartel do Carmo, dos anúncios da emissora nacional, das imagens emotivas do 1.º de Maio de 1974 que juntou, braço a braço nas ruas de Lisboa, opositores e apoiantes da revolução na celebração do dia do trabalhador.
Só este sentimento superficial e frívolo da data justifica, em minha opinião, a ausência de uma total reflexão, a ausência de um verdadeiro sentimento de festa, de uma verdadeira comemoração.
Brindar ao 25 de Abril tornou-se embaraçoso, criticável em muitos meios, objecto de escárnio em quase todos, quase que politicamente incorrecto.
Gerações subsequentes a 1974 elegem Salazar como o maior português de sempre, debitam discursos importados de que a origem de todos os males reside nesta data, que no “antigamente” é que havia respeito.
Falam convictos, apaixonados e apologistas de um regime que não conheceram mas de que ouvem falar, de uma realidade que não conseguem conceber, mas pela qual, ainda assim, advogam.
Como poderei eu, pertencente à geração de 81, opinar sobre algo que desconheço, mas a que chamam de ditadura, de forma minimamente isenta e esclarecida se, desde a nascença, me foi permitido pensar, opinar e manifestar sem correr risco de acabar na prisão?
Independentemente do que sucedeu no PREC, dos excessos que tiram a razão e das atrocidades a que a sede de poder conduziu, gostava , por instantes, de que o 1.º de Maio de 1974 fosse um pouco mais do que fotografias a preto e branco perdidas nos álbuns de família e nos recortes de jornais.
Gostava de sentir o mesmo brilho que a geração dos meus pais sente quando relata o seu dia 25 de Abril de 1974 e o seu amanhecer incerto e suspeito.
Gostava que esta data significasse um pouco mais do que um momento de euforia ao som de canções revolucionárias na cave do “Tóquio” com cravos artificiais pendurados ao peito.
2 comentários:
Já tinha lido este teu post ontem, mas só hoje quando vinha a caminho do trabalho é que soube como o comentar.
É complicado sentir o "brilho" de outrora, porém o simples reconhecimento do que se passou não o deveria ser. Da parte que me toca, reconheço que o meu way of life se deve, em parte, a direitos adquiridos por outros em 1974, no entanto não passo muito disto.
Na minha condição de observador, verifico que outros não pensam assim. Por um lado, surgiu hoje uma notícia que uns coitados que queriam gritar uns "25 de Abril sempre, fascismo nunca mais" à frente da antiga sede da PIDE acabaram por levar uma carga policial e foram presos tendo, eventualmente, pensado que a repressão voltara. Por outro lado, o facto da mesma polícia ter sentido a necessidade de proteger o cartaz do PNR no Marquês, leva-me a crer que outros não têm mesmo noção do conceito de liberdade, confundindo-o facilmente com o de anarquia. Confuso? Sim! Preocupante? Também.
Mas aliando estas pequenas ocorrências a todas as notícias de corrupção, conflitos de interesses, favorecimentos e afins que têm surgido, não posso deixar de questionar: Para quando uma nova revolução? Talvez aí possamos sentir esse "brilho".
Ps: Desculpa não ter dito nada na 3ªfeira para ir ver os cravos artificiais no Tóquio, no entanto, quando recebi a tua mensagem, já ia entre o 4º e o 5º sono.
Bjs
As tuas "angústias" são partilhadas por mim...diariamente!;)
p.s Estás perdoado por terça.
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